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18 de setembro de 2010

Lendo de um jeito completamente diferente

Por Kevin Kelly*

Introdução
Em seu mais recente tratado, publicado na última edição da Smithsonian Magazine, Kevin Kelly, um brilhante pensador da convergência entre tecnologia, mídia e sociedade, narra a evolução da leitura da antiguidade à atualidade e nos oferece sua visão da próxima etapa. Concordando ou não com sua visão, é inevitável extrair do artigo valiosos insights sobre a crescente importância da vinculação entre texto e imagem, da desagregação da informação em unidades mais flexíveis e permeáveis e dos caminhos para engajar os leitores "ativos" do futuro. E, para os que temem pelo futuro das mídias impressas, o texto de Kelly não deixa dúvida que a palavra impessa se tornará cada vez mais relevante. Traduzi** e compartilho aqui mais esse texto do co-fundador da Wired. É um pouco comprido, é verdade, mas vale muito a pena.



Lendo de um jeito completamente diferente
A leitura e a escrita, assim como todas as tecnologias, são dinâmicas. Na antiguidade, autores frequentemente ditavam seus livros. O ditado soava como uma série ininterrupta de letras, de modo que escribas anotavam as letras em uma seqüência longa e contínua, assimcomoocorremnafala. Espaços entre as palavras permaneceram ausentes dos textos até o século 11. Essa escrita contínua tornava os livros difíceis de serem lidos e, portanto, apenas algumas pessoas desenvolveram o talento de ler aos demais em voz alta. Ser capaz de ler em silêncio para si mesmo era considerado um talento incrível. Escrever era uma habilidade ainda mais rara. Na Europa do século 15, apenas um em cada 20 homens adultos sabia escrever.

Após o surgimento da imprensa de Gutenberg por volta de 1440, os livros produzidos em massa mudaram a forma como as pessoas liam e escreviam. A tecnologia de impressão expandiu o número de palavras disponíveis (de cerca de 50.000 em Inglês Antigo para um milhão hoje). Mais opções de palavras ampliaram o que podia ser comunicado. Mais opções de meios de comunicação ampliaram os temas sobre os quais se podia escrever. Autores não precisavam mais compor só tomos eruditos. Podiam "desperdiçar" livros baratos para contar histórias de amor (o romance foi inventado em 1740), ou publicar suas memórias, mesmo que não fossem Reis. As pessoas podiam escrever panfletos de oposição ao consenso dominante e, com a impressão barata, suas idéias heterodoxas podiam ganhar influência suficiente para derrubar um rei ou um papa. Com o tempo, o poder dos autores pariu a noção da autoridade e alimentou uma cultura de competência. A perfeição era alcançada "by the book" [expressão em inglês que significa "rigorosamente conforme as regras" mas que se traduz literalmente como “pelo livro”]. Leis foram compiladas em volumes oficiais, contratos foram registrados em papel e nada mais era válido, se não estivesse por escrito. Pintura, música, arquitetura, dança eram todas importantes, mas o coração da cultura ocidental palpitava ao ritmo da virada das páginas de um livro. Em 1910, três em cada quatro cidades nos Estados Unidos com mais de 2.500 moradores contavam com uma biblioteca pública. Nos tornamos um povo do livro.

Hoje, cerca de 4,5 bilhões de telas digitais iluminam nossas vidas. As palavras migraram da polpa de madeira para pixels em computadores, telefones, laptops, consoles de jogos, televisores, outdoors e tablets. Letras já não são fixadas no papel com tinta preta, mas flutuam sobre uma superfície de vidro em um arco-íris de cores tão rápidas quanto um piscar de olhos. Telas preenchem nossos bolsos e pastas, os painéis dos carros, as paredes das salas e dos edifícios. Eles repousam diante de nós quando trabalhamos – independente do que fazemos. Agora, somos um povo da tela. E, claro, estas telas recém-ubíquas mudaram o modo como lemos e escrevemos.

29 de julho de 2010

Melhor que Grátis

por Kevin Kelly*

Introdução
Traduzi e reproduzo aqui este texto originalmente publicado no blog de Kevin Kelly, The Technium, no início de 2008, porque não encontrei, até hoje, nenhum que fizesse pergunta mais perspicaz e assustadora sobre a transformação pela qual as indústrias da mídia estão passando: “O que as pessoas estão dispostas a comprar quando as cópias se tornam gratuitas?” E ele ainda nos oferece uma penca de repostas visonárias e profundamente ponderadas. São respostas que inspiram mas, talvez, a pergunta seja ainda mais importante.


A internet é uma máquina copiadora. Em seu nível mais fundamental, ela copia cada ação, cada caractere, cada pensamento que temos enquanto estamos nela montados. Para enviar uma mensagem de um canto a outro da internet, os protocolos de comunicação exigem que a mensagem inteira seja copiada diversas vezes pelo caminho, Empresas de tecnologia ganham muito dinheiro vendendo equipamentos que facilitam o copiar incessante. Cada um dos dados produzidos em qualquer computador está copiado em algum lugar. A economia digital, portanto, corre sobre um rio de cópias. Ao contrário das reproduções em massa da era das máquinas, essas cópias não são apenas baratas, são gratuitas. 

Nossa rede de comunicação digital foi engendrada para que cópias fluam com o mínimo possível de fricção. De fato, as cópias fluem tão livremente que poderíamos pensar na internet como um sistema de super-distribuição no qual, uma vez introduzida a cópia, ela irá fluir pela rede para sempre, como eletricidade num fio supercondutor. Há evidências disso na vida real. Uma vez que qualquer coisa que pode ser copiada entra em contato com a internet, ela será copiada, e essas cópias jamais desaparecem. Até um cachorro sabe que não dá para apagar algo uma vez que fluiu pela internet.

Esse sistema de super-distribuição se tornou a fundação de nossa economia e de nossa riqueza. A duplicação instantânea de dados, idéias e mídia subvenciona todos os principais setores da economia americana, particularmente os envolvidos em exportação – ou seja, aquelas indústrias nas quais os EUA têm vantagem competitiva. A riqueza americana está depositada sobre um grande aparelho que copia constantemente e de maneira promíscua.

Porém, a rodada anterior de riqueza naquela economia foi gerada a partir da venda de cópias preciosas, então o fluxo livre de cópias gratuitas tende a depreciar a ordem estabelecida. Se reproduções de nossos melhores esforços são gratuitas, como podemos continuar? Trocando em miúdos, como se pode ganhar dinheiro vendendo cópias gratuitas?