6 de setembro de 2010

A melhor janela disponível

Como o leitor, espectador ou ouvinte escolhe o meio pelo qual irá acessar determinado conteúdo? Naturalmente, não há uma resposta simples já que cada um tem suas idiossincrasias, mas há um conceito que pode ser muito útil para ajudar produtores de conteúdo, publicitários e gestores de empresas de mídia a estruturarem seu pensamento sobre o tema: o da "best available window".


Trata-se de uma teoria simples e poderosa (eu ousaria chama-la de lei - Lei da Melhor Janela Disponível). Diz o seguinte: o consumidor sempre escolherá a melhor janela disponível para consumir informação ou entretenimento. Se entendemos isso como uma verdade absoluta - e parece razoável que o façamos - determinar em quais canais devemos apostar se torna um exercício muito menos desafiador ainda que continue exigindo grande empenho. Caveat emptor: "melhor" é um conceito subjetivo, mas a aplicação da lógica e de um pouquinho de conhecimento sobre natureza humana nos permitem desenvolver vários corolários da lei para cercar a questão e reduzir o escopo da análise.

Depende do formato do conteúdo
Essa é até um pouco óbvia. A melhor janela disponível vai depender da natureza do conteúdo. Para um conteúdo em vídeo a melhor janela é aquela com a melhor combinação de tamanho e resolução. Já para texto e imagem estática, a melhor janela é a que proporciona a melhor combinação de conforto ótico e portabilidade (o que significa não só a possibilidade de carregara pra lá e pra cá mas também a facilidade para posicionar e manter à distância ideal dos olhos). E, a despeito da ilustração que usei para este post, a melhor janela pode ser analógica (um livro, uma revista, etc.). Assim, entender as características dos meios que os consumidores do seu conteúdo valorizam e o grau em que elas são proporcionadas por cada meio disponível no mercado é fundamental.

As pessoas tendem à inércia
A primeira lei de Newton se aplica bem aos seres humanos. Tendemos a permancer na condição em que nos encontramos a não ser que uma força maior aja sobre nós. Funciona assim com a adoção de novas tecnologias. As pessoas em movimento - a minoria também conhecida como early adopters - anseiam pelos mais novos gadgets e gizmos e continuam sempre se mexendo na direção do novo. Já a maioria prefere ficar onde está até que uma força maior obrigue um movimento. Há várias forças que podem provocar movimento: a inveja é uma das mais frequentes, mas a obsolescência, o benefício e a oportunidade também são forças importantes. Mas, independente das forças em ação, a empresa de mídia pode procurar medir o grau de inércia associado aos meios em que atua e poderia atuar e, a partir dessa medida, extrapolar o quanto deve investir em cada um.

A conveniência é o benefício mais valorizado
Segundo estudo do Morgan Stanley, 75% da informação e entretenimento consumida na web é gratuita para o consumidor e sustentada por publicidade enquanto 75% do consumido pela internet nos aparelhos celulares é pago pelo consumidor. Isso ocorre por um motivo muito simples: é fácil pagar por meio do telefone celular. Na maioria dos casos, os conteúdos que se consomem pelo celular são pagos com um clique e apareçem na conta enviada pela operadora no final do mês. Essa facilidade é fundamental pois o preço que a pessoa paga se calcula não só em dinheiro mais também em tempo. A maioria das pessoas faz um cálculo rudimentar de valor com base nessas variáveis (ainda que pesquisas de economia comportamental indiquem que nem sempre os nossos cálculos são completamente racionais). Medir conveniência não é tarefa fácil, mas medir tempo e dinheiro é. Você deve saber os preços que cobra e quanto custam as alternativas ao que oferece, mas sabe quanto tempo demora para pagar pelo seu conteúdo ou para acessá-lo através de determinado dispositivo?

O bolso ainda fala bem alto
Para que uma janela esteja "disponível", ela precisa ser adquirida. Assim, é importante não só analisar as taxas de penetração de diferentes dispositivos (e dos serviços de acesso que os tornam aptos a serem usados para adquirir e consumir conteúdo) mas também procurar entender a velocidade na qual essa penetração está se desenvolvendo e os fatores que podem influenciar essa evolução. Embora nossas decisões não sejam inteiramente racionais, como já disse, o cálculo de quando um dispositivo se torna economicamente vantajoso para o consumidor é possível e pode ser uma base bastante sólida para outras previsões. Por exemplo, se sabemos que adultos brasileiros das classes A e B leem 10 livros por ano, que a vida útil dos e-readers é de 2 anos e que a média de preço dos livros no Brasil é de R$24, podemos supor que os e-readers só irão atingir uma penetração significativa nesse segmento de consumidores quando tiverem preços abaixo de R$480 (e quanto mais abaixo, maior será a penetração já que, elas por elas, ficamos na inércia). É claro que isso supõe a disponibilidade de títulos para esses dispositivos, mas esse é outro problema.

Depende da hora, do local e da companhia
A melhor janela para um mesmo conteúdo pode ser diferente também de acordo com as circunstâncias do consumidor. Se ele está no trabalho, a melhor janela para ver um jogo de futebol pode ser a tela do computador ao invés da televisão. Se ele está em casa e outros membros da família estiverem usando os computadores, a melhor janela para acessar um website pode ser o celular. E o celular pode ser vantajoso, também se ele quiser acessar um conteúdo pequeno e simples com rapidez, pois não terá de esperar o computador ligar. Se ele está no carro, a melhor janela para ouvir a programação de uma estação de rádio será o aparelho de som do carro (a não ser que a antena esteja quebrada, obrigando-o a sintonizar a rádio pelo celular no viva voz). Para conteúdos "ao vivo" os quais 95% da audiência deseja consumir no horário de orginação e, também, para muitos conteúdos de informação dos quais a primazia é um elemento importante , saber onde o público-alvo estará durante a emissão original é essencial. Já para outros conteúdos - em especial os de entretenimento - o consumidor valoriza a janela a ponto de esperar para consumir o conteúdo quando ela estiver disponível.


Aplicar a lei e seus corolários deve ajudar o profissional da mídia a não só priorizar a escolha de canais e meios de distribuição de conteúdo, mas também a entender como ele pode se remunerar por seu trabalho em cada um deles. Não se trata de uma resposta, mas apenas de uma estrutura de pensamento e análise por meio da qual se procurar as respostas corretas sobre seu conteúdo e seus consumidores. Não é um mapa e sim uma bússola. O mapa cada um tem que desenhar. Deve haver outros corolários da Lei da Melhor Janela Disponível que a tornem mais útil e, quem sabe, talvez haja até outras leis. Se pensar em alguma, escreva pra mim. 

Um comentário:

Ricardo Anderáos disse...

Além das qualidades físicas de cada janela, creio que há que se considerar também a POSTURA FISICA que cada uma delas nos cobra para entendermos a opção pela "melhor possível" em cada caso... Sem querer aprofundar a discussão bioenergética ou mergulhar nas teses de Alexander Lowen, o computador nos coloca sentados e inclinados para frente (posição de atenção), enquanto a TV nos coloca reclinados para trás (posição de relexamento). Um iPad, com seus 800g, exige uma postura mais "computadorizada" do que um livro, que pode ser lido confortavelmente na cama (sempre vejo usuários de iPads sentados com o aparelho no colo, e a cabeça inclinada para baixo). Um smartphone trafega bem por todas essas posturas, mas tem a limitação do tamanho da tela. A melhor tela possível, na minha opinião, será um implante cerebral que projete a imagem diretamente no córtex visual. Até lá continuaremos produzindo os mais diferentes formatos de lixo tecnológico, sempre acreditando que o mais novo e bem marqueteado é o definitivo.