15 de outubro de 2010

Internet Móvel no Brasil? Ainda Não.

As condições para o desenvolvimento da internet móvel são pouco favoráveis no Brasil. Pense duas vezes antes de apostar alto em produtos, serviços e ações de marketing e publicidade para esse novo meio. As maiores oportunidades agora estão na internet fixa de banda larga.

O acesso à internet por aparelhos móveis está decolando nos Estados Unidos e na Europa depois de ter, já há alguns anos, dominado o Japão. Muitas previsões indicam que se tornará o modo predominante de acesso à rede global nos próximos dez anos. No Brasil, tendemos a acreditar que todas as grandes tendências dos países desenvolvidos desembarcarão por aqui cedo ou tarde - e acabam chegando mesmo. Algumas empresas antenadas apostam nisso e começam, desde já, a desenvolver estratégias de comunicação voltadas para esse novo meio, investindo pesado nas inovações a ele vinculadas. O problema é que, no ritmo da era digital, a diferença entre "cedo" e "tarde" pode significar custos de oportunidade ou mesmo perdas significativos.

Se as condições mercadológicas atuais permanecerem estáveis, a internet móvel não será um meio de comunicação relevante no Brasil antes da próxima Copa do Mundo. Há quatro principais motivos para isso. Primeiro, o preço pouco acessível dos smartphones (aparelhos celulares com os recursos necessários para navegação completa na internet) limita sua penetração. Mesmo que essa barreira seja superada pelo pagamento a prestações, a conta dos planos de dados pesa ainda mais no bolso. E essa conta é encarecida pela alta carga tributária dos serviços de telefonia móvel. Isso desincentiva utilização desses serviços pelos usuários e, portanto, também investimentos em inovação por parte das empresas. Por fim, a baixa penetração das redes 3G (e quem dirá das 4G) aliada à baixa velocidade da rede nos poucos lugares onde está disponível, limita a experiência do usuário com esse meio.

Smartphones caros
O preço médio dos smartphones no Brasil ainda é alto, na casa dos R$1.400. Para se ter uma perspectiva, isso é um pouco mais do que renda per capita mensal média dos brasileiros. É verdade que os preços estão caindo mas ainda demora para se tornarem tão acessíveis quanto são em países desenvolvidos. Por isso, a taxa de penetração desses tipos de aparelhos na base de celulares do Brasil, hoje, é apenas em torno de 8%.

Mensalidade alta
Uma vez que o consumidor investe num aparelho moderno, ele se depara com outra barreira. Segundo o recém-lançado estudo Information Economy Report 2010 da UNCTAD (Conferência das Nações Unidas para o Comércio de Desenvolvimento), o custo mensal para o usuário de um telefone com acesso à internet é em torno de 120 dólares no Brasil, o maior do mundo. Na Índia e na China, esse custo mensal é de menos de 20 dólares. Os valores do estudo da UNCTAD incluem todos os custos, inclusive o do aparelho em si, mas são os pacotes de dados, sobretudo, que aumentam a conta da internet móvel para o consumidor brasileiro com o preço médio por MB móvel na faixa dos R$5.

Aí vêm os impostos. Sobre a conta telefônica incidem o ICMS estadual, cuja alíquota varia entre 25% e 35% dependendo do estado, e os tributos federais COFINS (3%) e PIS (0,65%). Como a alíquota é aplicada sobre o valor final da conta o consumidor paga imposto sobre o próprio imposto. Assim, uma alíquota total de 29% representa uma tributação efetiva de 40%. Ou seja, um consumo de R$100 custa um mínimo de R$140 para o consumidor. Isso, nos estados com ICMS "baixo". Nos estados com alíquota de ICMS de 30%, como o Rio de Janeiro, a tributação efetiva é de 51%.


Serviço limitado
Montar uma rede 3G é um investimento enorme e de alto risco para uma operadora de telefonia celular. Além disso, as operadoras ainda estão recuperando investimentos feitos para montar redes GSM e CDMA no passado recente. Por isso, as redes 3G no Brasil hoje cobrem apenas 13% do território nacional. Dada essa cobertura limitada, o serviço é utilizado por menos de 5% dos assinantes de telefonia celular no Brasil, algo em torno de 9 milhões de pessoas. Com as redes 4G já começando a ser implantadas em países desenvolvidos, pode acabar fazendo sentido para operadoras locais "saltarem" a tecnologia 3G, abandonando os investimentos feitos até agora e focando na tecnologia mais avançada. Essa prática se torna cada vez mais comum em economias emergentes mas não deixa de impor uma demora em termos de desenvolvimento. Na prática, ela impõe um atraso no curto prazo para conquistar um avanço maior no long prazo.

O que fazer?
Para profissionais de marketing, publicidade e comunicação, portanto, a palavra de ordem em se tratando da internet móvel é "cautela". Isso não quer dizer que não se deva investir em projetos de internet móvel. Pelo contrário, está mais do que claro que se trata de uma tendência mundial que, "cedo ou tarde", chegará ao Brasil. Tampouco é desprezível o público de 9 milhões de consumidores de internet móvel. É um público de alto poder aquisitivo e propenso à adoção de novas tecnologias. Isso o caracteriza como um atraente alvo para experimentos.

Assim, a ótica apropriada é a de começar a testar novos produtos e serviços para estarem prontos quando a inetrnet móvel amadurecer. Para o banco Morgan Stanley, a maturidade é alcançada quando a tecnologia é utilizada por pelo menos 20% do mercado consumidor. O cuidado que se deve tomar com a internet móvel, portanto, é o de não dedicar uma parcela excessiva dos recursos humanos e financeiros da empresa a esse meio antes da hora. Ou seja, dosar os investimentos de acordo com o grau de oportunidade.

Enquanto a internet móvel alcança hoje menos de 5% da base de consumidores, a internet fixa de banda larga alcançou recentemente a taxa "mágica" de penetração. Segundo dados do Plano Nacional de Banda Larga, a internet fixa em alta velocidade (ainda que nem tão rápida assim no Brasil) está disponível, hoje, em cerca de 21% dos domicílios brasileiros. A maior oportunidade de momento, portanto, é a de consolidar estratégias de produtos e serviços para a web fixa de alta velocidade. Ou seja, experimente com a internet móvel mas se comprometa com a internet fixa.

Um comentário:

Mbeltran disse...

Bom texto Rodrigo.
Realmente por tudo isso que você colocou e o relatório publicado pela ONU, que coloquei em meu site: http://www.precavido.com.br/2010/10/15/internet-movel-no-brasil-e-a-mais-cara-do-mundo-juntamente-com-o-zimbabue-leia-a-integra-do-relatorio/ vemos porquê certas coisas aqui demoram tanto pra ir pra frente e sempre somos atrasados em relação ao resto do mundo...